Do livro de Amélia Pinto Paiva “Para compreender Fernando Pessoa.”
ANTES O VÔO DA AVE
Antes o voo da ave, que passa e não deixa rasto,
Que a passagem do animal, que fica lembrada no chão.
A ave passa e esquece, e assim deve ser.
O animal, onde já não está e por isso de nada serve,
Mostra que já esteve, o que não serve para nada.
A recordação é uma traição à Natureza.
Porque a Natureza de ontem não é Natureza.
O que foi não é nada, e lembrar é não ver.
Passa, ave, passa, e ensina-me a passar!
Este poema de Alberto Caeiro ((Heterónimo de Fernando Pessoa) inicia-se pelo advérbio “antes”, que marca a preferência, uma tomada de posição clara em favor do que não deixa rasto – o voo da ave -, e, portanto, se contenta em ser e não deixar recordação, a qual “é uma traição à Natureza.”
Você precisa fazer login para comentar.